Jornalismo Fiteiro e a Etica


Em 1992 nos EUA a rede de TV ABC se usou de câmeras escondidas para investigar um caso em que os funcionários de um Super-mercado da Carolina do Norte eram flagrados trocando a validade de produtos vencidos, o que gerou um prejuizo de U$ 1,7 bilhão a mesma. Depois os reportéres foram  condenados a pagarem U$ 5,5 milhões ao Supermercado.
No Brasil tivemos o caso Carlinhos Cachoeira bicheiro que foi preso na operação Monte Carlo, que pode ser a ponta do iceberg que envolve vários políticos,grupos económicos e a mídia na nossa sociedade. Aqui passa a se questionar muito mais alem de quais possam ser os seus ramos de negócios, mas também se busca saber como ele fez para que muitas pessoas estivessem ao seu serviço neste pais. Como contraventor Cachoeira não podia ter sua atuação empresarial legalizada e por isso se usava de amizades com políticos para aliviar a situação dos seus negócios. Quem estivesse no seu caminho teria sua vida investigada e escancarada pela mídia.

Agora estourou sua ligação com o editor Policarpo Júnior da Veja de Brasília revista de maior circulação no Brasil onde Cachoeira pautava vários assuntos inclusive usando de recursos questionáveis como no caso da arapongagem por meio de escutas ilegais e vídeos forjando flagrantes como foi o caso do vídeo produzido por um araponga Jairo Martins do Staff do Bicheiro,  onde mostra um diretor do Correios embolsando propina de R$ 3 mil. PJ e Abreu foi co-autor da denuncia sobre a corrupção que deu origem a crise do Mensalão.  Ou seja um criminoso trazendo informacões e servindo como fonte para uma revista.
Outro caso aconteceu durante o governo Collor e ficou conhecido por Collorgate por se tratar de divulgação na imprensa de documentos aparentemente falsos e operacoes clandestinas de conversas que tentam comprometer o Presidente da Republica e outros políticos da época. Se pressupõe que antes de divulgar documentos e informacoes de origens suspeitas, deve-se investigar a origem e a autencidade e veracidade das informacoes contidas neles. Muitas vezes a midia considera tudo legal, mesmo antes de investigar.
Em 2000 a Revista Istoé divulgava conversas em áudio onde o juiz aposentado Nicolau dos Santos denunciava suas relações com o ex assessor da Presidência da Republica Eduardo Jorge, com o Ministro Martus Tavares, o Senador Romeu Tuma e seu filho Robson. Segundo Alberto Dines do site do Observatório da Imprensa, não se tratava apenas de um grampo ilegal, mas também ilegítimo, isso porque ao ler o texto da revista percebe-se não se tratava de conversa telefónica autorizada ou não pela justiça, a fita da Revista Istoé reproduzia uma entrevista armada feita pelo ex assessor do ex Senador Luiz Estevão onde ele arrancava confissões de culpa do juiz Nicolau. No sábado após a publicação da grampo, os jornais já afirmavam não ser grampo. A Policia Federal e o Ministério Publico começaram uma investigação na fita e o Juiz Nicolau afirmou não ser sua voz na fita.
A supostas gravações ilegais por parte da mídia não se limitam ao campo politico, faz parte da rotina comum de algumas emissoras em busca de sensacionalismo para sua programação, veja o caso ocorrido no ultimo dia 04/02/2012 no Jornal Hoje em que uma reportagem supostamente com o pretexto de se mostrar investigativa expõe através de câmeras  escondidas, manobristas de carro desviando objetos de dentro do veículos ao qual estão para evitar roubo. Na verdade os manobristas são colocados em armadilhas, sem contudo ter suas identidades protegidas.
Para preparar o flagrante os jornalistas colocaram deliberadamente no interior dos carros grandes valores em moedas e até doces como "tentação" (palavra usada na reportagem) para provocar e induzir os manobristas a um comportamento delituoso. Criaram um cenário artificial tentador que não corresponde à expectativa de um veículo comum que utiliza os serviços de estacionamento nas grande cidades, um cenário de causar tanto estranhamento que durante a reportagem os manobristas flagrados exclamam: "essa eu nunca vi não"; se espantam: "o carro aqui parece uma doceria"; e desconfiam: "tem câmera? têm ou não têm?" (Fernando Mares de Souza Blog Roteiro de Cinema News roteironews.blogspot.com.br/2012/01/
flagrantes-preparados-do-jornal-hoje.html)

Pela súmula 145 do STF, o flagrante preparado ou flagrante provocado- o estimulo de uma pessoa a outra para que esta pratique o ato típico de uma infração penal, com o intuito, porém, de surpreendê-la no momento da execução - é ilegal, ou seja não há crime quando o fato é preparado mediante provocação ou induzimento, direto ou por concurso, de autoridade, que o faz para fim de aprontar ou arranjar o flagrante (STF, RTJ, 98/136

Onde Fica a Ética?

A própria Globo se contradiz nos seus princípios editoriais onde diz que o uso de micro câmaras e gravadores escondidos, só se torna legitimo quando esta indo para registrar condutas ilícitas, criminosas ou contrarias ao interesse publico e deve agir com parcimônia em casos de gravidade.
Agir com parcimônia não prever induzir alguém a fazer algo. No caso o Código de Ética dos Jornalistas no Capitulo III artigo 11 nas alíneas II e III diz que: “O jornalista não pode divulgar informações de carácter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes e obtidas de maneira inadequada, por exemplo, com o uso de identidades falsas, câmaras escondidas ou microfones ocultos, salvo em casos de incontestável interesse público e quando esgotadas todas as outras possibilidades de apuração.”

No caso da matéria do Jornal Hoje não haviam se esgotadas todas as possibilidades. Se provou mais uma vez que a busca pela suposta defesa do cidadão usa métodos ilícitos que invalidam o desejo de se apurar algo pertinente ao bem comum.
Tanto no Brasil como em outras partes do mundo se usam de recursos escusos para saber a vida secreta das pessoas, seja para divulgar informações relevantes e que podem ajudar as pessoas a tomarem conhecimento de algo que esteja afetando suas vidas, como também em casos de pura busca pela audiência como podemos ver em alguns países como no Reino Unido no conhecido caso Murdoch no jornal News of the World com 168  anos de existência e que se envolveu em grampos e escutas telefônicas ilegais de políticos, artistas e ate da família real.
Claro que questionamos algo baseados no que diz códigos de conduta de uma certa profissão no caso aqui a de jornalista, mas o que não podemos deixar passar também como seres humanos, ate que ponto meios ilícitos podem invalidar fins lícitos. A busca pela verdade dos fatos no jornalismo leva muitas vezes ao extremo de irmos  de encontro aquilo que buscamos. Como então chegar a verdade, se quando estamos perto de uma informação preciosa somos barrados por leis de inviolabilidade do lar, por exemplo?
Ate que ponto uma pessoa de vida publica pode ter direitos de ter vida privada, quando seus atos afetam diretamente grande parcela da população?
Quando vemos casos como o da emissora americana ABC, ficamos diante de uma situação bem comum ate aqui no Brasil de crimes contra os consumidores que tem seus direitos muitas vezes burlados e não tem como se ressarcir de prejuízos se não através das denuncias da imprensa que vira aliada rotineira dos cidadãos nas suas reivindicações cotidianas. De um lado o direito do consumidor, do outro o direito do Empresário de ter seu estabelecimento resguardado a privacidade.
Então saímos do campo do jornalismo e vamos ao campo comum da vida das pessoas e somos invadidos por câmeras espalhadas por todos os cantos do pais, seja no Supermecado, no transito, no Shopping, somos tomados por armadilhas do Estado, do empresário, da segurança publica que vigia nossos passos com o pretexto de nos proteger de nos mesmos. Se o jornalismo tem suas limitações de atuações onde ficam nossos direitos quando somos invadidos na nossa relação com a cidade onde vivemos por câmeras  espalhadas por todos os lugares por onde andamos?
O caso Carlinhos Cachoeira vai muito mais alem do que invasao de privacidade, ultrapassa os limites de flagrante, quando induz as pessoas gravadas a falar o que eles querem. Quando o Bicheiro se usou dessa pratica contra o Diretor dos Correios ele estava partindo para cometer mais ilegalidades forjando corrupção quando na verdade houve a indução de ato.

O caso mais emblemático em que se usou a espionagem na politica foi Watergate em 1972 quando membros  do Partido Republicano ligados ao Presidente Richard Nixon invadem a sede do Partido Democrata Watergate em busca de fotografar e colocar escutas clandestinas para espionar os seus advesários políticos. Nesse caso se torna ainda mais grave quando políticos se usam da investidura do cargo para praticar tudo que acham que podem. Não devemos questionar só o ser ou não ilegal, mas os nossos direitos de termos nossa vida particular preservadas de atos que podem nos colocar numa situação ruim. 
A vida atual que estamos inseridos se tornou a sociedade do espetaculo, onde o desejo de ver o que acontece com a vida alheia se tornou algo muito forte. Os chamados realits shows se espelharam pelo mundo. A vida de um cidadão monitorada e você sem saber participado de um show da vida real. Caso como o Big Brother onde participantes decidem ficar num ambiente fechado juntos sabendo que sao vigiados 24 horas por dia nos possibilita ver que existe a câmera escondida aceita por nos.
Consentimos muitas vezes o sermos vigiados apenas por diversâo como nesse caso do BBB, porem outras vezes abrimos nossas vidas a estranhos por necessidade de sobrevivência como medo da violência das grandes cidades e acabamos livres de sequestros, de assaltos, porem presos ao nosso mundo, sendo vigiados pelos sistemas de segurança.
O que nos salva do mal, nos aprisiona. Precisamos da informação diária e ficamos satisfeitos quando alguém é preso por causa do que saiu no noticiário e aquilo se torna uma verdade porque justamente temos  confiança na credibilidade daquela emissora, porem não refletimos os métodos que foram utilizados para conseguir aquela informacao. De um lado o licito e de outro o ilícito. Ate que ponto podemos controlar como sociedade os exageros da mídia em sua investigação usando métodos clandestinos como escuta telefônica e câmera escondida?
Se hoje somos ajudados por uma informação que se usou desses métodos e prendeu alguem que agiu errado, amanha poderemos ser vitimas desse mesmo sistema que muitas vezes publica informações sem checar quem pode ser a fonte e se essa fonte realmente merece confiança para ter seu material publicado.
 

Referencias:

http://fichacorrida.wordpress.com/2012/05/10/cpmi-deve-discutir-relaes-da-cachoeira-com-a-mdia/ acesso em 10/05/2012
http://grupobeatrice.blogspot.com.br/2012/05/veja-agora-pode-ser-bola-da-vez-na-cpi.html acesso em 10/05/2012
A midia e o Jornalismo Fiteiro: Observatorio da Imprensa, Biblioteca Oi, Alberto Dines, Claudio Weber Abramo, Helio Doyle, Luiz Claudio Cunha e Luiz Weis







  



Por Carlos Emanuel

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